Os nossos governantes repetem-se nos vícios de maneira tão enfadonha quanto escandalosa. Como publicamos, Jair Bolsonaro quer gastar quase meio bilhão em publicidade entre a segunda metade de 2021 e primeira metade de 2022, ano da eleição presidencial. É um Everest de dinheiro, perto do qual os atuais 124,5 milhões previstos para serem gastos até o meio de 2021 são um Pico da Neblina. Não há motivo para gastar tanto assim com publicidade estatal mesmo que houvesse folga no orçamento da União — e ele está apertadíssimo. A não ser promover o próprio governante e beneficiar aliados e amigos de ocasião, entre os quais os veículos de comunicação condescendentes. No caso de Bolsonaro, sabe-se bem quais são os veículos dos quais ele espera uma grande força para a sua reeleição. Pode até sobrar para aqueles que não são tão amigos assim, uma vez que o ministro das Comunicações, Fábio Faria, tem se mostrado um hábil construtor de pontes. Ainda mais agora, no rastro devastador da pandemia, com as empresas jornalísticas penduradas na borda do precipício.
Quase meio bilhão, imagine você… Como escrevi em 2016, num artigo para a nossa newsletter e publicado no livro Cartas de um Antagonista, não há um país civilizado que jogue fora tamanho volume de recursos dessa maneira. A melhor propaganda de um governo é simplesmente fazer um bom governo, porque os cidadãos percebem isso na sua vida cotidiana. Publicidade estatal é para vender mentiras ou amplificar pequenas verdades que, assim, se transformam em grandes lorotas. É também por isso que não aceitamos anúncios governamentais ou de empresas estatais neste site e na Crusoé.
Vou reproduzir o meu artigo escrito em 2016. Não me culpe pela repetição. Quem se repete nos vícios são os governos, lembre-se.
O artigo intitula-se “A propaganda governamental é o mensalão da imprensa”:
Aparelhados pela companheirada, os fundos de pensão dessas estatais igualmente aparelhadas entraram como sócios de negócios feitos sob medida para perder dinheiro dos trabalhadores e enri- quecer a malandragem campeã nacional. O esquema esteve à nossa frente durante pelo menos dez anos, mas contou com o silêncio cúmplice da maioria das empresas jornalísticas, receosas de perder a verba publicitária controlada pelos criminosos.
Tal é o meu ponto: o escândalo dos fundos de pensão deveria levar a que movimentos pela verdadeira democracia e entidades civis respeitáveis exigissem a extirpação completa da excrescência chamada propaganda governamental. A pretexto de divulgar as suas realizações, concretas ou não, ministérios, secretarias e estatais — federais, estaduais, municipais — gastam bilhões de reais a cada ano para comprar consciências, promover políticos e partidos e encher as burras de agências de publicidade e comunicação que superfaturam contratos e repassam parte da grana para os encarregados de liberar a verba. Não há um país civilizado que jogue fora tamanho volume de recursos dessa maneira.
A propaganda governamental é o mensalão da imprensa. É imperioso acabar com ele.
Daqui a quatro anos, provavelmente estarei dizendo a mesma coisa. Porque nós, senhores, estivemos sempre do mesmo lado.