O que querem jornalistas que pedem censura? O que querem jornalistas que pedem censura?
O Antagonista

O que querem jornalistas que pedem censura?

avatar
André Marsiglia Santos
3 minutos de leitura 22.01.2022 17:15 comentários
Opinião

O que querem jornalistas que pedem censura?

Uma carta assinada por cerca de duzentos jornalistas pedindo que a Folha de S.Paulo não concedesse mais espaço a ideias consideradas racistas foi divulgada na última quarta-feira. O jornal respondeu defendendo sua liberdade editorial e o imbróglio se fez.    Não entendo que a defesa pura e simples de uma ideia, desenvolvida com...

avatar
André Marsiglia Santos
3 minutos de leitura 22.01.2022 17:15 comentários 0
O que querem jornalistas que pedem censura?
Foto: brotiN biswaS/Pexels

Uma carta assinada por cerca de duzentos jornalistas pedindo que a Folha de S.Paulo não concedesse mais espaço a ideias consideradas racistas foi divulgada na última quarta-feira. O jornal respondeu defendendo sua liberdade editorial e o imbróglio se fez.   

Não entendo que a defesa pura e simples de uma ideia, desenvolvida com argumentos válidos, possa ser racismo. O racismo geralmente é avesso à via intelectual. Assim como é avesso à via intelectual uma carta que sirva não para pedir o diálogo, mas o silêncio.

Uma carta assim é escondidamente um ato de censura, ou de autocensura, afinal um jornalista desejar que outro não fale será sempre um bumerangue a lhe voltar à testa mais ou menos tarde.

O ponto que me incomoda nessa história toda e que escapou aos que analisaram a carta: o que leva jornalistas a pedirem censura?

É realmente difícil entender um país como o nosso. Com uma história toda entrecortada por autoritarismos e repúblicas de ocasião, a censura nos soa familiar, como um parente que vai ficando em casa, se ajeita no nosso sofá, bebe de nossa cerveja, urina de porta aberta.

Além disso, a censura não é um conceito fácil: habitou tanto a obra de Platão e Rousseau como o cassetete de soldados toscos e a toga de algumas excelências duvidosas. Hoje em dia, é tão hábil que faz crer a alguns ser possível existir uma censura do bem.

Talvez um dos primeiros a cultivar essa ideia tenha sido Owen Fiss. Partindo do pressuposto de que o debate público vivia de poucas e mesmas ideias, o professor norte-americano, na década de 90, propôs que aquelas que fossem menos visíveis – de minorias vulneráveis – silenciassem as demais, ocupando-lhes o espaço, para equilíbrio do debate.   

O problema é que a censura não é um ato intelectual, mas de poder. E não há equilíbrio possível quando resulta em ideias mortas. Também não há equilíbrio, mas pretensão à hegemonia, em ideias impostas pela força. Na prática, a proposta de Fiss – que é a mesma pretendida pela carta dos jornalistas – desequilibra igualmente o debate, apenas invertendo as peças do tabuleiro.

Fiss estava errado; não se alcança o equilíbrio do debate de ideias pelo poder, pois este despreza a transformação, cobiça a ideia única, o mundo reduzido, para que possa dele melhor se apoderar.

E nada mais triste para uma ideia do que ser solitária. Isolada, se torna incapaz de transformar e ser transformada. Canetti, ao tratar do poder, dizia: onde a ocasião para a transformação é impedida, a expressão se enrijece em uma máscara.

Quem passa a viver é a máscara, não a ideia. Não é esse o mundo em que eu gostaria de estar. Não me parece ser o mundo em que jornalistas sejam bem-vindos.

André Marsiglia é advogado, atua nas áreas de Comunicação e Internet e é colunista n’O Antagonista.

Esportes

Brasileirão terá 1° partida com arbitragem 100% feminina

26.04.2024 22:30 2 minutos de leitura
Visualizar

Fux pede vista em julgamento sobre desoneração

Visualizar

Reunião entre organizada do Corinthians e direção tem promessa de apoio e "Fagner irresponsável"

Visualizar

Rodolfo Borges na Crusoé: A inteligência artificial mente

Visualizar

Ilha de Cultura: Uma educação argentina e brasileira, com Fabio Giambiagi

Visualizar

Alexandre Soares na Crusoé: O mundo woke, por trás das câmeras

Visualizar

Tags relacionadas

André Marsiglia Santos Antonio Risério censura folha
< Notícia Anterior

Busca por testes de Covid quintuplica e atinge novo recorde

22.01.2022 00:00 4 minutos de leitura
Próxima notícia >

Alemanha volta a incluir Brasil na lista de alto risco para Covid

22.01.2022 00:00 4 minutos de leitura
avatar

André Marsiglia Santos

André Marsiglia Santos é advogado constitucionalista especializado em liberdades de expressão e de imprensa. Membro da Comissão de Liberdade de Imprensa da OAB-SP, e da Comissão de Mídia e Entretenimento do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP), Consultor Jurídico da Associação Nacional de Editores (ANER) e membro da 4ª câmara de julgamento do Conselho de Ética do CONAR. Idealizador da L+: Speech and Press e sócio do Lourival J Santos Advogados.

Suas redes

Os comentários não representam a opinião do site; a responsabilidade pelo conteúdo postado é do autor da mensagem.

Comentários (0)

Torne-se um assinante para comentar

Notícias relacionadas

Felipe Neto, o Excrementíssimo e a liberdade de expressão

Felipe Neto, o Excrementíssimo e a liberdade de expressão

Madeleine Lacsko
26.04.2024 17:10 3 minutos de leitura
Visualizar notícia
Josias Teófilo na Crusoé: Duas faces do Brasil

Josias Teófilo na Crusoé: Duas faces do Brasil

26.04.2024 15:59 2 minutos de leitura
Visualizar notícia
Jerônimo Teixeira na Crusoé: Alex Jones e os limites da liberdade

Jerônimo Teixeira na Crusoé: Alex Jones e os limites da liberdade

26.04.2024 15:50 2 minutos de leitura
Visualizar notícia
Leonardo Barreto na Crusoé: Descuido com o fiscal indica que Lula não pensa na reeleição?

Leonardo Barreto na Crusoé: Descuido com o fiscal indica que Lula não pensa na reeleição?

26.04.2024 13:01 2 minutos de leitura
Visualizar notícia

Seja nosso assinante

E tenha acesso exclusivo aos nossos conteúdos

Apoie o jornalismo independente. Assine O Antagonista e a Revista Crusoé.